quarta-feira, 21 de abril de 2021

Sara e Agar a alegoria das 2 alianças

                          A  ALEGORIA  DAS 2 ALIANÇAS  ( Gálatas 4:21-31 )

Nessa carta Paulo leva em conta o perigo dessa igreja ser estultificada como um ramo do judaísmo.

 . A circuncisão é um assunto liquidado

 . Devido cenário local ele apresenta princípios cristãos eternos

 ( Vale a pena,depois ver sobre a heresia marcionita,a importância dela para Lutero e a forma errônea que a critica moderna viu colocando o ensino paulino diferente do ensino petrino )

Paulo então apresenta  na carta com o Argumento Doutrinário que contém alguns apelos

1. Começa sobre o emergir da filiação ( 4:1-7 )

2. Um apelo pessoal ( 4:12-20 )

3. Um apelo alegórico ( 4:21-31 )

Esse vamos comentar por ser mais desenhado,logo fácil de entender o argumento doutrinário

Usando o terreno comum,Paulo mostra a autoridade dos livros da lei.

Ele chama a atenção dos que querem ser escravos dos rudimentos  ou "debaixo da lei"

 - O que a lei diz sobre a presente situação?

Paulo usa então a história da família de Abraão de Gênesis 17 e 17

 - Sem citar os nomes para chamar a atenção,Paulo mostra as categorias às quais pertenciam

 - παιδίσκης Significa "criada ",mas no tempo patriarcal não havia essa diferença

 - ἀλλ’  Ressalta a diferença dos dois filhos,tanto de posição social como de circunstâncias

  "segundo a carne"mostra que um a geração foi natural ( escravo )

  . Confiança no planejamento humano

  "mediante a promessa" por intervenção divina (livre)

  . Confiança na promessa divina

- Paulo transfere-se dos filhos para as mães ( 24 )

διαθῆκαι Alianças ou negociação de Deus com Abraão ( 3:17 ),mostrando o número de alianças para contrastá-las,para que escolham entre : a Lei e a Promessa

1. Refere-se ao monte Sinai,mostrando que assim como uma escrava só poderia produzir filhos numa condição de escravo,assim a lei mosaica só podia produzir escravos  e esta é para a lei e esta é Agar . ( Um judeu jamais viria assim,pois para eles,descendentes de Abraão  o Sinai era uma herança para Isaque ) Esta era a situação de Jerusalém naquela época ou o judaísmo da época,onde Jerusalém era a capital,ocupada por Roma.

A escravidão aqui era dupla : escravidão com a lei e escravidão com Roma( duplo fardo )

2. Jerusalém espiritual é livre ( que está por vir ),a Igreja Cristã

ἄνω Lá de cima,mostra as noções pré-cristãs que Jerusalém poderia se tornar,como se tornou

Paulo não está se referindo à Jerusalém celestial,mas à Igreja Cristã

Sara ( A Jerusalém do alto ) geraria os filhos da promessa ( livres ),como Isaque o foi ou os filhos da Nova Aliança em Cristo

Ele cita Isaías 54:1 pegando a tradução da LXX,onde a esterilidade foi transformada em frutificação ou a frutificação da Igreja. Apesar da esterilidade e despojo da Igreja da época e o judaísmo em sua glória,hoje a palavra de Paulo se cumpriu.

ἐπαγγελίας A palavra promessa está ligada à promessas feitas anteriormente na carta

3. Carne e Espirito Paulo usa a metáfora ( diferente do verso 23 ) contrastando o filho que nasce segundo a carne e o que nasce segundo a promessa ( Espirito ),mostrando a forma como Deus age na Nova Aliança.

A perseguição citada refere-se a Gênesis  21:9,onde assim também havia uma perseguição ou pressão mental.

Paulo então vem com uma pergunta retórica: O que diz as escrituras?

Ele cita Gênesis 21:10 (palavras de Sara) como exemplo de uma ação firma para impedir que a liberdade dos gálatas cedesse lugar à escravidão.

Quando um princípio cristão está em jogo a igreja deve ser inflexível.

CONCLUSÃO 

Ele conclui sua alegoria,incluindo os filhos verdadeiros e exclui os filhos escravos

O uso de "escravo" aqui de origem grega é qualitativo

O uso de " livres " refere-se aos ligados a Cristo o Libertador

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Hermeneutica

                                                            HERMENÊUTICA


OBJETIVO GERAL 

Fornecer aos alunos condições para ler e interpretar a Bíblia de forma responsável, séria e frutífera, seguindo os princípios de interpretação consagrados pela história, e que derivam-se das convicções da Bíblia como Palavra de Deus. 

OBJETIVO ESPECÍFICO 

. Proporcionar aos alunos um conhecimento básico de hermenêutica 

. Despertar o aluno a compreender a importância do uso da hermenêutica

. Apresentar aos alunos algumas regras básicas para o uso da interpretação bíblica. 

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

A NATUREZA DA HERMENÊUTICA. 

1. A palavra hermenêutica 

2. Objeto da hermenêutica 

3. O processo hermenêutico

SÍNTESE HISTÓRICA DA INTERPRETAÇÃO CRISTÃ DA BÍBLIA 

1. Escola de Alexandria 

2. Escola de Antioquia 

3. Os Pais Latinos 

4. A Idade Média 

5. A Reforma Protestante 

6. Período Pós-Reforma 

7. Período Moderno e Contemporâneo

A NECESSIDADE DA HERMENÊUTICA. 

1. O distanciamento causado pela natureza humana da Bíblia 

2. O distanciamento causado pela natureza divina da Bíblia

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Evangelicalismo brasileiro e a limitação da soberania divina

                                 Evangelicalismo e a limitação da soberania divina


A doutrina da liberdade humana e a da conseqüente auto-limitação de Deus afetam o conceito de soberania divina ensinada,infelizmente em alguns círculos reformados. Ela admite uma soberania de Deus geral e limitada.

" Deus restringe seu poder por causa da criatura, de tal modo que neste momento a vontade de Deus não está sendo feita na terra como no céu. Isto significa que Deus corre riscos ao criar um mundo verdadeiramente significativo. Isso significa que, embora Deus tenha metas, ele faz uso de rotas abertas"

( Pinnock )

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Evangelicalismo

                                        EVANGELICALISMO BRASILEIRO










A Reforma Protestante redescobriu o evangelho da livre graça de Deus, que tinha sido obscurecido na igreja medieval por um moralismo que ignorava a profunda depravação do homem, por um sacerdotalismo que se colocava entre os homens e Deus, e por um eclesiasticismo que apagava a distinção Criador-criatura, tornado-se a própria igreja a nova Encarnação. 

No cerne da Reforma estava uma ênfase renovada sobre o evangelho bíblico-paulinoagostiniano: salvação somente pela graça de Deus, sobre a base da obra expiatória de Cristo, recebida pela fé somente. 

Os Reformadores e suas igrejas tinham orgulho de serem conhecidos como “evangélicos”, visto que viam a si mesmos como pregando o puro evangelho, a mensagem do evangelho.

Quando ouvimos e vemos tantas reportagens dos chamados "teólogos evangélicos",temos vergonha de sermos chamados de evangélicos,pois o termo foi muito distorcido.

O que se passa hoje por evangelicalismo está, em muitos pontos, bem longe da Reforma, assim como está em geral longe do ensino bíblico em outros pontos. 

Quando amigos perguntam se sou evangélico, rapidamente digo “Não”. Porque freqüentemente eles identificam “evangélico” com “crer na Bíblia” e “pregar o evangelho”, tento explicar que é precisamente devido ao fato do evangelicalismo não crer corretamente na Bíblia ou pregar o evangelho fielmente, que não me considero um evangélico e não posso ser um membro de uma igreja evangélica (isso é grandemente verdade do fundamentalismo moderno, que é simplesmente uma versão mais restritiva e provincial do evangelicalismo). O que talvez seja os seus três principais distintivos permanece em total contraste com a crença e prática bíblica e reformada do Cristianismo. 

Embora os evangélicos modernos professem uma crença firme na Bíblia, no centro de sua religião não está a sua visão da Bíblia, mas sua visão do evangelho. O evangelicalismo orgulha-se sobre a centralidade do evangelho e da salvação. 

É justamente aqui, contudo, que o evangelicalismo está mais poluído. Na verdade, ironicamente o suficiente, a visão evangélica do evangelho está mais perto daquela da Roma medieval do que do evangelho bíblico da Reforma. 

O Concílio de Trento, a resposta católica romana à Reforma, sustentou que a salvação é um empreendimento cooperativo entre Deus e o homem. Deus coloca o processo em movimento (no batismo), mas o homem ajuda ao longo do processo.( Silas ao combater o calvinismo,defendeu essa idéia sinergista ou arminiana ). De acordo com Roma, o livre-arbítrio do homem desempenha uma grande parte em sua salvação. 

Os Reformadores reconheceram corretamente que isso destruiu o evangelho da graça de Deus. Abriu o caminho para o homem afirmar sua própria contribuição, bondade e justiça. Para os evangélicos, isso é quase uniformemente sua própria “decisão”. Nesse ponto, eles são um com Roma. 

O evangelicalismo é essencialmente uma deturpação do novo nascimento, a institucionalização da experiência de conversão. A coisa importante sobre a salvação é a experiência do homem, seus sentimentos sobre ser salvo. Uma dose pesada desse experiencialismo foi introduzida na igreja no Wesleyianismo do século dezoito, e tem sido uma marca do evangelicalismo desde então. 

A experiência de Wesley foi a de ficar “estranhamente aquecido” quando ouviu o evangelho, e essa experiência tornou-se uma peça central de sua teologia. (Para ser justo, a soteriologia de Lutero também era de certa forma autobiográfica, mas ela guiou-o em direção de uma salvação somente pela obra de Deus.

Para Calvino, em contraste, nossa salvação reside na obra objetiva da expiação de Cristo. Os homens não são salvos pelo que experimentam; eles são salvos pelo que Cristo realizou. Em Sua grande obra redentora sobre a cruz e em Sua ressurreição, Cristo assegurou a salvação do Seu povo, cumprindo as exigências da lei ao substituir judicialmente os pecados dos pecadores.

Quando o evangelho é pregado, ele atrai eficaz e irresistivelmente aqueles a quem Deus escolheu. Eles são conquistados por Cristo, o seu Redentor. Eles são trazidos sob seus joelhos em humilde submissão, e não podem fazer nada senão exercer fé na obra redentora de Jesus Cristo. 

Essa experiência, embora essencial, é um resultado da expiação objetiva de Cristo e da aplicação do evangelho pelo Espírito Santo.

Para os evangélicos isso é muito sofisticado e também “intelectual”. O  fato realmente central é que Deus perdoou os seus pecados, aceitou-os em Sua família, tornou-os felizes, e preparou-os um lar no céu. 

Para o evangélicalismo, o evangelho centra-se na vontade e prazer do homem; para os Reformados, o evangelho centra-se na vontade e prazer de Deus. Porque ser um evangélico significa abraçar a sua forma de evangelho centrado no homem, não podemos ser evangélicos.

A ala Reformada da Reforma expressava a unidade do pacto de Deus no Antigo e Novo Testamento. Os evangélicalismo enfatiza a falta de unidade entre esses pactos, pois para os evangélicos o objetivo da Fé é reproduzir “o Cristianismo do Novo Testamento”. 

Os evangélicos crêem em ¼ da Bíblia; os cristãos Reformados crêem numa Bíblia inteira. Evangélicos rotineiramente desprezam a autoridade do Antigo Testamento. A lei do Antigo Testamento, eles afirmam, é parte do “velho” pacto, e foi destinado somente para o antigo Israel; hoje ouvimos apenas as palavras de Jesus, João, Paulo e assim por diante. 

Os evangélicos estão entre os mais ruidosos em insistir sobre “crer na Bíblia de capa a capa”, mas não crêem que ¾ do que aparece entre as capas tenha qualquer relevância para hoje. 

Eles falam hipocritamente sobre “estrita inerrância bíblica”, mas isso em geral é simplesmente “conversa piedosa”, pois eles negam que as provisões do novo pacto estavam em operação no Antigo Testamento (Gl. 4:22-31). Eles não vêem muito do evangelho, se é que algo, no Antigo Testamento. 

E porque o evangelicalismo centra-se no evangelho, isso significa que o Antigo Testamento é largamente irrelevante. Funcionalmente, portanto, o termo “crente na Bíblia” não se aplica a maioria dos evangélicos. 

Isso leva diretamente à característica final do evangelicalismo, a qual os cristãos que crêem na Bíblia devem repudiar expressamente. Para os evangélicos, é o evangel, o evangelho (limitada e erroneamente definido, é claro) que deveria impressionar nossas vidas. Para os Reformados, é a soberania de Deus e Seu governo régio absoluto na Terra que é impressionante. O evangelho evangélico não é meramente deturpado; é limitado. O evangelho evangélico é um fim em si mesmo. “Manter nossas almas longe do inferno” é todo o significado da vida sobre a Terra. Para os Reformados, o significado da vida sobre a Terra é a submissão absoluta a Cristo, o nosso Redentor real, e o trabalho diligente para estender o Seu reinado na Terra. 

Evangelismo é um meio essencial para esse fim, mas não o próprio fim. Afirmar que o evangelismo é um fim em si mesmo é expor uma teologia deturpada e centrada no homem. O fim é a glória de Deus e, com referência ao Seu plano para a Terra, a expansão gradual, porém inexorável do Seu reino (Mt. 6:33; 13:31-34). 

Os evangélicos estão intensamente interessados no tipo de evangelismo deles. Porque esse evangelismo não é apenas deturpado, mas também limitado, ele não se relaciona com muitos aspectos da vida. Porque o evangelismo é o centro de sua religião e por não se relacionar com muitos aspectos da vida, a própria religião não se relaciona com muitos aspectos da vida. Porque sua religião não se relaciona com muitos aspectos da vida, eles tendem a pensar como os humanistas mundanos naquelas áreas sem relação com sua religião limitada. 

Esse é o porquê, em primeiro lugar, o método apologético evangélico compromete o evangelho, como Cornelius Van Til tão poderosamente demonstrou. Os evangélicos estão dispostos a comprometer tudo, até Deus mesmo, por causa de seu ídolo precioso, o seu evangelho deturpado e limitado. 

Esse é o motivo da maioria deles não ver nada de errado em enviar seus filhos para escolas do governo, adotar uma psicologia secular, ensinar uma ciência evolucionária, eleger políticos ateus e endossar traduções errôneas da Bíblia. 

Essas áreas estão além do alcance de seu evangelho limitado. Tudo além do escopo de seu evangelho limitado é algo legal para uma perspectiva “neutra” (isto é, violadora do pacto). Por essas razões, onde quer que o evangelicalismo moderno tenha florescido, ele tem bombardeado a ortodoxia bíblica histórica; eviscerado uma fé forte e teologicamente ancorada; e castrado uma religião robusta, vigorosa e abrangente. Seu sucesso tem sido o fracasso do Cristianismo bíblico. Conseqüentemente, ser um evangélico no sentido moderno é diluir e eventualmente destruir a Fé. 

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Os atributos divinos

                                                   OS ATRIBUTOS DIVINOS


. Os atributos não são partes de Deus ( Ele não é um composto de várias partes)

. Os atributos são a forma como Deus revelou-se a nós

. Eles formam um todo harmonioso

Tomás de Aquino : "Os atributos revelam o que Deus é em relação às suas criaturas"

Shedd : "Os atributos são uma descrição próxima do que seja a essência de Deus "

. Os atributos são qualidades essenciais de Deus,revelando aspectos do ser de Deus


                                                  1. OS NOMES DE DEUS 

Êxodo 20:7 era um nome que revelava "todas as qualidades de Deus"em relação ao seu povo.

Esse nomes não são invenção humana,mas dadas pelo próprio Deus,revelando-se ao homem.

Esses nomes mostram sua pessoalidade:

a) Nomes próprios

b) Nomes essenciais ( atributos)

c) Nomes pessoais ( Pai,Filho e Espirito Santo )

                                                1.A. NOMES NO VELHO TESTAMENTO


A) 1. ‘EL, ‘ELOHIM, ‘ELYON.

EL é o nome mais simples que designa Deus no V.T. ( ser primeiro,ser Senhor) (forte e poderoso)

Sempre aparece no plural e usado na poesia.

B) ADONAI .

Capacidade de julgar,governar.

Aquele à quem tudo está sujeito

O transcendente que se compadece das criaturas

"Adonai",foi suplantado por  Yahweh  aquele que se relaciona com suas criaturas)

C) ’EL-SHADDAI. 

Aquele que possui todo poder no céu e na terra,todos subservientes da sua graça

Êxodo 6:2 Deus gracioso

D) YAHWEH TSEBHAOTH. 

Yahweh superou os nomes anteriores  e quem o mencionasse seria morto ( Levítico 24:16)

Êxodo 3:13-14 ( Hawah ) indica a imutabilidade de Deus,ligando sua imutabilidade com seu povo

TSEBHAOTH 

1. Senhor dos Exércitos ( 1 Samuel 4:4)

2. Exércitos dos céus,podendo referir-se às estrelas

3. Exército dos anjos ( com suas hierarquias ) (Gênesis 28:12,32:2 )


                          2. OS NOMES NO NOVO TESTAMENTO


1. THEOS 

Mesmo nome de Elyon ou Elohim (hebráico) (Marcos 5:7)

2. KYRIOS

Mesmo que Yahweh ,significando o "alpha e o ômega) (Apocalipse 1:4)

A Septuaginta substitui por Adonai,traduzindo por Kyrios( poder) e o Novo Testamento segue a mesma linha,usado também em relação a Cristo

3.  PATER.

Sempre usado como nome de Deus em relação à israel ( Deuteronômio 32:6)

Mostra a relação teocrática de Deus

domingo, 26 de julho de 2020

A transmissão do pecado

                                               A TRANSMISSÃO DO PECADO 
                                                             ( Introdução )
Tanto a Escritura como a experiência nos ensinam que o pecado é universal e, de acordo com a Bíblia, a explicação dessa universalidade está na queda de Adão. 
Estes dois pontos: a universalidade do pecado e a relação de Adão com a humanidade em geral, pedem consideração.
Enquanto tem havido acordo geral quanto à universalidade do pecado, tem havido diferentes explicações da ligação entre o pecado de Adão e o dos seus descendentes.
1. ANTES DA REFORMA. 
Os escritos dos apologetas nada contêm de definido a respeito do pecado original, ao passo que os de Irineu e Tertuliano ensinam claramente que a nossa condição pecaminosa é resultado da queda de Adão. Mas a doutrina da direta imputação do pecado de Adão aos seus descendentes, até a eles é estranha.
Tertuliano tinha uma concepção realista da humanidade. Segundo ele, toda a raça humana estava potencial e numericamente em Adão e,portanto, pecou quando ele pecou, e se tornou corrupta quando ele se tornou corrupto. A natureza humana completa pecou em Adão e, daí, toda individualização dessa natureza também é pecaminosa. 
Orígenes, que foi profundamente influenciado pela filosofia grega, tinha um conceito diferente sobre o assunto, e praticamente não reconhecia ligação alguma entre o pecado de Adão e o dos seus descendentes. Ele via e explicação da pecaminosidade da raça humana primariamente no pecado pessoal de cada alma num estado pré-temporal, embora mencione também certo mistério de geração.
Agostinho partilhava a concepção realista de Tertuliano.Apesar de falar de “imputação”, ainda não tinha em mente a imputação direta ou imediata da culpa de Adão à sua posteridade. Sua doutrina do pecado original não é inteiramente clara. Talvez isto se deva ao fato de que ele hesitava na escolha entre o traducionismo e o criacionismo.
Embora acentuasse o fato de que todos os homens estavam seminalmente presentes em Adão e pecaram de fato nele, também se aproximava muito da ideia de que eles pecaram em Adão como seu representante. Contudo, sua ênfase principal recaía na transmissão da corrupção do pecado.
O pecado é transmitido por propagação, e esta propagação do pecado de Adão é, ao mesmo tempo, um castigo por seu pecado. 
Wiggers expõe resumidamente a ideia com estas palavras: “A corrupção da natureza humana, na raça toda, foi o justo castigo da transgressão do primeiro homem, em quem todos os homens já existiam”. 
O grande oponente de Agostinho, Pelágio,negava essa conexão entre o pecado de Adão e o da sua posteridade. Como ele a via, a propagação do pecado pela geração natural envolvia a teoria traducionista sobre a origem da alma que ele considerava um erro herético; e a imputação do pecado de Adão a quem quer que fosse, a não ser a ele próprio, estaria em conflito com a retidão divina.
O Conceito pelagiano foi rejeitado pela igreja, e o pensamento dos escolásticos em geral seguia as linhas indicadas por Agostinho, sempre recaindo a ênfase na transmissão da corrupção de Adão, e não na transmissão da sua culpa. 
Hugo de São Vítor e Pedro Lombardo sustentavam que a concupiscência real macula o sêmen no ato de procriação, e que essa mancha de algum modo contamina a alma em sua união com o corpo.
Anselmo, Alexandre de Hales e Bonaventura salientavam a concepção realista da ligação entre Adão e sua posteridade. Toda a raça humana estava seminalmente presente em Adão, e, portanto, também pecou nele. Sua desobediência dói desobediência da raça humana inteira. Ao mesmo tempo, a geração era considerada a condição sine qua non da transmissão da natureza pecaminosa. Em Bonaventura e outros depois dele, a distinção entre a culpa original e a corrupção original foi expressa mais claramente. A ideia fundamental era que a culpa do pecado de Adão é imputada a todos os seus descendentes. Adão sofreu a perda da justiça original e com isso incorreu no desprazer divino. Como o resultado,todos os seus descendentes estão privados da justiça original e, nessas condições, são objetos da ira divina. Além disso, de algum modo a corrupção do pecado de Adão passou à sua posteridade, mas a maneira como se deu essa transmissão era matéria de discussão entre os escolásticos. Visto que não eram traducionistas e, portanto, não podiam dizer que a alma, que,afinal de contas, é a verdadeira sede do mal no homem, passa de pai a filho pelo processo de geração natural, perceberam que tinha que ser dita alguma coisa mais para explicar a transmissão do mal inerente. 
Alguns diziam que este é transmitido por meio do corpo, o qual, por sua vez, contamina a alma assim que entra em contato com ela. Outros, sentindo o perigo dessa explicação, procuravam-na no simples fato de que todo homem nasce agora no estado em que Adão estava antes de ser dotado da justiça original, e, assim, está sujeito à luta entre a carne,livre e desenfreada, e o espírito. 
Em Tomaz de Aquino, a ênfase realista reaparece, e vigorosamente, embora numa forma modificada. Ele assinalou que a raça humana constitui um organismo e que, como o ato de um membro do corpo – digamos, a mão – é considerado como ato da pessoa, assim o pecado de um membro do organismo da humanidade é imputado ao organismo todo.
2. APÓS A REFORMA. 
Embora os reformadores não concordassem com os escolásticos quanto à natureza do pecado original, a opinião que tinham da sua transmissão não continha quaisquer elementos novos. As idéias de Adão como representante da raça humana, e da imputação “imediata” da sua culpa aos seus descendentes, não foram expressas com clareza em suas obras. 
De acordo com Lutero, somos tidos como culpados por Deus por Deus por causa do pecado herdado de Adão e que reside em nós. 
Calvino fala num tom um tanto semelhante. Ele sustenta que, desde que Adão foi, não somente o progenitor da raça humana, mas também a sua raiz, todos os seus descendentes nascem com natureza corrupta; e que tanto a culpa do pecado de Adão como a própria corrupção inata são-lhes imputadas como pecado. 
O desenvolvimento da teologia federal trouxe à primeira plana a idéia de Adão como o representante da raça humana, e possibilitou uma distinção mais clara entre a transmissão da culpa e a da corrupção nata constitui também culpa aos olhos de Deus, a teologia federal deu ênfase ao fato de que há uma imputação “imediata”da culpa de Adão aos que ele representou como o chefe da aliança.
Os socinianos e os arminianos rejeitaram a idéia da imputação do pecado de Adão aos seus descendentes. 
Placeus, da escola de Saumur, defendeu a idéia da imputação “mediata”. Negando toda imputação imediata, ele sustentava que, porque herdamos de Adão uma natureza pecaminosa, merecemos ser tratados como se tivéssemos cometido a ofensa original. 
Este ensino foi uma novidade na teologia reformada (calvinista), e Rivet não teve dificuldade para provar isso, coletando longa lista de testemunhos. Seguiu-se um debate no qual a imputação“imediata” e a “mediata” foram apresentadas como doutrinas mutuamente exclusivas; e no qual se fez parecer que a questão real era se o homem é culpado à vista de Deus unicamente por causa do pecado de Adão, imputando àqueles, ou unicamente por causa do seu próprio pecado inerente. 
A primeira destas não é a doutrina das igrejas reformadas (calvinistas), e a segunda não foi ensinada nelas antes da época de Placeus. Os ensinamentos deste se introduziram na teologia da Nova Inglaterra, e se tornaram a principal característica da Nova Escola (New Haven). 
Na teologia modernista, a doutrina da transmissão do pecado de Adão a sua posteridade é inteiramente desacreditada. Ela prefere buscar a explicação do mal existente no mundo numa herança animal, que não é pecaminosa. 
Por estranho que pareça. Até Barth e Brunner, apesar de se oporem violentamente ao modernismo teológico, não consideram a pecaminosidade universal da raça humana como resultado do pecado de Adão. Historicamente, este ocupa um lugar único, meramente como o primeiro pecador.

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Teologia Bíblica da Mulher

                                                   TEOLOGIA BÍBLICA DA MULHER

A Igreja tem espelhado os padrões da sociedade no que diz respeito à compreensão da mulher e de seu papel. Ainda encontramos locais onde tudo é fechado e proibido a ela, com base em geral num dogmatismo intolerante. No outro extremo, encontramos completa abertura quanto à posição e função da mulher no Corpo de Cristo, geralmente calcada em argumentos situacionais e pragmáticos.
Grandes denominações tradicionais (como Batista e Presbiteriana) e pentecostais históricas (Assembléia de Deus e Congregação Cristã) relutam em ceder à ordenação de mulheres ao pastorado. Tal linha de pensamento é normalmente denominada complementarista, sendo também aceitos os termos hierarquistas ou diferencialistas.[1]
Já outras denominações, embora também tradicionais (como Metodista e Luterana), vangloriam-se de ordenar mulheres ao ministério pastoral e presbiteral, seguindo os passos de carismáticos de vários matizes e horas (Evangelho Quadrangular, Renascer, Palavra da Fé). São os chamados igualitaristas, pois advogam plena igualdade.
O debate entre essas duas escolas de pensamento tem trazido mais calor que luz ao assunto. Os igualitaristas com freqüência recorrem a argumentos de cunho sócio-cultural, atribuindo à posição complementarista um conceito de superioridade masculina. Os complementaristas muitas vezes enfatizam as diferenças com base apenas na tradição ou nos costumes denominacionais, sem responder efetivamente ao desafio sócio-cultural que a questão apresenta para a Igreja contemporânea.
Embora a sensibilidade ao clima sócio-cultural de nossa época, área particularmente tão debatida na sociedade nas últimas décadas, seja uma virtude, é necessário buscar nas Escrituras a definição do papel honroso e importante concedido por Deus à mulher, de modo especial à mulher cristã.
Não se pode firmar posição sem algum trabalho histórico e exegético. Para isso, devemos empreender uma observação panorâmica da condição da mulher em diversas civilizações ao longo da história e examinar algumas passagens neotestamentárias, particularmente as paulinas. Paulo tem sido o bode expiatório numa espécie de diálogo de surdos sobre a posição e o papel da mulher. Ele precisa falar por si e por seu mundo, por assim dizer. Para isso, precisamos começar com um pouco de história.

1. A condição da mulher no oriente médio antigo

2. A condição da mulher na cultura grega

3. A condição da mulher na cultura romana

4. A condição da mulher no judaísmo

                                         

           Uma teologia bíblica da mulher

No Antigo Testamento
Depois de uma visão rápida e geral da posição da mulher em diferentes culturas, é necessário voltarmos a atenção ao Antigo Testamento. Aqui se encontram os fundamentos para a correta compreensão do papel da mulher na Igreja.
A posição adotada quanto ao propósito divino para a mulher e ao valor que ela possuía na revelação dada a Moisés determinará, em grande medida, a perspectiva do intérprete das controvertidas passagens sobre a mulher no Novo Testamento.
O texto de Gênesis 1.26-28 ensina, entre outras coisas, que o conceito de Homem engloba a ideia de homem e mulher. A gramática do texto hebraico é surpreendente:
Hebrew Gn 1
A alternância entre o sufixo pronominal objetivo direto singular e plural é quase tão intrigante quanto o uso do verbo no singular (criou) para um substantivo plural (Elohim). Ainda que estruturalmente distintos (homem e mulher), ambos eram Homem. Na verdade, a soma de ambos era Homem. A humanidade dependia de serem homem e mulher.
A mulher participava com o homem na constituição da imago Dei. Embora o significado da expressão imagem de Deus continue a ser debatida, certamente inclui a capacidade de relacionamento entre as três pessoas da Trindade. O reflexo de Deus no Homem precisava demonstrar essa categoria fundamental da natureza divina, daí a necessidade de um relacionamento pessoal íntimo, como o que seria mais tarde definido como “osso dos meus ossos e carne da minha carne” (Gn 2.23).
A mulher participava com o homem na tarefa de sujeitar a terra. Novamente a gramática hebraica alterna pronomes singulares (“Domine ele sobre …” [Gn 1.26]) e pronomes plurais (“Dominem [eles] sobre os peixes do mar…” [Gn 1.28]). O domínio sobre a criação é elemento importante na imagem de Deus.
O homem foi estabelecido como regente de Deus, o primeiro exemplo de terceirização na história. Homem e mulher eram essenciais para essa tarefa, embora Gênesis não discrimine a parte que cabia a cada um deles. Naturalmente a sujeição da terra dependia de haver pessoas espalhadas por ela, e aí os papéis eram claramente definidos e a interdependência dos sexos, óbvia (argumento que defensores de estilos “alternativos” de relacionamento insistem, cegamente, em ignorar).
A narrativa mais relacional da criação do homem, em Gênesis 2.18-25, ilumina a complementação apenas sugerida em Gênesis 1. A mulher foi criada como “auxílio” para o homem. As traduções portuguesas não contribuem para uma percepção equilibrada dessa frase. Termos como “adjutora” e “auxiliadora” obscurecem o sentido do texto e sugerem uma subordinação essencial, que o texto original não indica.
Na verdade, o termo hebraico aqui usado (ezer) é um dos epítetos mais comuns para o próprio Yahweh, o Deus de Israel (cf. salmo 33.20).[21] Logo, a passagem naturalmente valoriza a mulher, em lugar de desmerecê-la. Ela é apresentada numa posição privilegiada, como agente de Deus na vida do homem.
A mulher foi criada para corresponder ao homem em seus aspectos fisiológico e psicológico. A expressão hebraica kenegdow (literalmente “como que diante dele”) enfatiza essa correspondência, que por sua vez é inserida, quanto à origem, num contexto de dependência (Eva foi tirada do lado de Adão). Tal conceito encontra equilíbrio no ensino de Paulo sobre a interdependência entre os sexos (1Co 11.11,12).
Esta passagem também contribui para entendermos a origem do conceito de autoridade no relacionamento homem-mulher. O fato de Adão ter designado o nome “genérico” de sua companheira já indica, a partir da criação, a idéia de hierarquia, fundamentada não em caráter valorativo, mas funcional, segundo o que Deus atribuiu a cada um dos cônjuges. A subordinação da mulher, portanto, não se iniciou com a Queda. Nesse momento, o que surgiu foi a competição pela autoridade, com a conseqüente desarmonia.
O nome dado à mulher, ishá, é uma paronomásia muito criativa, pois auditivamente sugere a idéia de derivação do homem (Heb., ish), e lexicamente aponta para a maior delicadeza estrutural da mulher, já que em termos léxicos a palavra é derivada da raiz hebraica anash, que indica fraquezafragilidade. Não seria de admirar se esta passagem estivesse na mente de Pedro ao escrever o texto de 1Pedro 3.7.
Vejamos outras passagens do Antigo Testamento que indicam tanto zelo quanto valorização da mulher.
Êxodo 21.7-11: indica que a mulher, mesmo na condição de escrava, tinha direitos inalienáveis que deveriam ser respeitados, caso contrário a Lei assegurava sua liberdade.[22]
Êxodo 22.22: aponta para a atenção que, idealmente, Israel deveria dispensar aos desvalidos da sociedade, viúvas e seus filhos. A profundidade dessa instrução se reflete em Tiago 1.27.
Deuteronômio 21.10-17: refere-se à proteção oferecida até mesmo à mulher cativa de guerra. Seus sentimentos deviam ser respeitados, assim como sua expressão de luto e sua individualidade. Ainda que derrotada na guerra, a dignidade humana proibia ao israelita cometer abusos de violência física e emocional a que outras nações submetiam seus cativos.
Deuteronômio 22.22-29: indica que a legislação israelita dava sempre o benefício da dúvida à mulher em situações que envolviam sexo ilícito. Este é o caso da “noiva”; sexo pré-conjugal podia acarretar o pagamento de uma compensação ao pai da noiva e um casamento sem possibilidade de divórcio (v. 28, 29) ou o simples pagamento de compensação dobrada, caso o pai julgasse inconveniente a união conjugal (v. Êx 22.16, 17).
Provérbios 5, 7: se essa passagem não for analisada e compreendida no contexto do movimento de sabedoria em Israel, pode apresentar uma visão erroneamente machista. A mulher ardilosa e adúltera aqui mencionada não tipifica a mulher em geral. Trata-se da corporificação da vida avessa a Deus, infiel ao padrão divino de vida significativa na comunidade da aliança. Embora seja um personagem real, não corresponde a um retrato 3×4 de todas as mulheres. No entanto, expõe o tremendo potencial da sexualidade feminina, que pode efetivamente dinamizar a vida do homem (cf. Pv 5.18, 19) ou destruí-la completamente (Pv 7.22-27).
Provérbios 31: também não pretende estereotipar a mulher. Seria injusto exigir aquele padrão de desempenho social de uma jovem mãe de três crianças na primeira infância. O que o texto retrata é a corporificação da sabedoria por meio da imagem da mulher madura, cujos filhos já são ouvidos na comunidade. A mulher que já exerceu seu tremendo papel de engenheira doméstica, facilitadora educacional, administradora e gerente de pessoal, consultora financeira, assistente social voluntária e motivadora do bem, e agora aumenta o patrimônio da família com sua criatividade e tino comercial. Não tenho dúvida de que algumas das prescrições de Paulo nas epístolas pastorais foram influenciadas pela eshet hail (“mulher de valor”) de Provérbios 31.

No Novo Testamento

A influência de Jesus
Os séculos que separam o fechamento do cânon do Antigo Testamento da abertura da história neotestamentária trouxeram a deterioração do relacionamento proposto por Deus para o homem e a mulher. Embora o último livro do cânon (ocidental) denuncie a facilitação do divórcio e a deslealdade machista contra as mulheres israelitas, ao tempo de Jesus os rabis justificavam o divórcio por trivialidades e simples razões estéticas.[23]
Não é propósito deste ensaio discutir o complexo tema do trato de Jesus com as mulheres. Algumas das indicações quase corriqueiras dos evangelhos sugerem que as condições de vida das mulheres de Israel no primeiro século da era cristã não eram tão adversas quanto faz supor a literatura feminista evangélica em sua ânsia por saudar Jesus como libertador.[24]
Embora Jesus não tenha alterado o aspecto doutrinário nem teológico da posição da mulher, não há como negar que ele alterou radicalmente o aspecto prático. A liberdade que Jesus concedia às mulheres e a misericórdia com que as tratava introduziu um conceito revolucionário de valorização da mulher.
Para o Mestre, homens e mulheres tinham os mesmos privilégios, embora preservasse claramente as diferenças implícitas em Gênesis e latentes na Lei quanto às esferas de atividade de cada sexo.
No aspecto geral, Jesus elevou a posição social da mulher ao restaurar o conceito original da indissolubilidade do casamento e ao receber mulheres entre os discípulos e ensiná-las diretamente. Jesus valorizou a capacidade intelectual e espiritual da mulher, sua capacidade de serviço e de empatia com os carentes.[25]

A influência de Paulo

O apóstolo Paulo tem sido chamado de misógino e filógino, acusado de machista e feminista, conforme a ênfase de seus comentaristas recaia sobre as passagens restritivas (1Co 14 e 1Tm 2) e subordinacionistas (Ef 5.22) ou sobre as liberativas (1Co 11 e Gl 3.28).
A proposta desta parte do ensaio é indicar áreas em que complementaristas precisam responder exegeticamente aos argumentos dos igualitaristas. Destacarei, para tanto, pontos específicos em que estes últimos laboram em erro e as linhas básicas das respostas necessárias quando se discutem a posição e a função da mulher no lar, na Igreja e na sociedade.
O texto de 1Coríntios 7, tão debatido quando o tema é divórcio, traz importantes ensinamentos para compor uma teologia bíblica da mulher:
  • O casamento não é intrinsecamente mau, e por isso não precisa ser evitado (v. 1, 2). Paulo queria corrigir o “efeito pendular” em Corinto. Alguns, por terem apresentado uma vida sexualmente desregrada antes da conversão, pensavam agora compensar adotando uma atitude de completa abstinência. Outros, talvez influenciados por um gnosticismo ascético incipiente, pregavam completa abstinência dentro do casamento. Tais idéias eram geralmente acompanhadas da depreciação da mulher, particularmente da sexualidade feminina, encarada incompatível com a espiritualidade cristã.
O tom de concessão que Paulo usa nestes dois versículos não deve ser entendido como depreciação do casamento, especialmente pelo fato de não dispormos da pergunta que originou a resposta. Alguns estudiosos pensam estar relacionado com pessoas (e casais) que desejavam dedicar-se ao ministério, o que conferiria outro tom às palavras de Paulo.
  • Há uma igualdade intrínseca no relacionamento matrimonial, tanto em direitos quanto em posse mútua (vv. 3-5). É notável que Paulo inicie sua exortação pelos maridos, exigindo deles que supram as esposas do que elas têm direito no contexto do relacionamento físico no casamento. Numa sociedade greco-romana na qual a mulher era dominada pelo marido ou se tornava libertina, a exigência inicial aos maridos era sobremodo notável.
  • Não há nenhuma concessão a relações extraconjugais (v. 9). Paulo revela mais uma vez que a ética conjugal cristã (e, por inferência, a visão cristã da mulher) estava muito acima do praticado (ou na melhor das hipóteses tolerado) por gregos e romanos.
  • A indissolubilidade do casamento é um ideal a preservar (vv. 10-16). Para evitar uma caixa de Pandora teológica, basta enunciar aqui algumas propostas: separação implica celibato ou reconciliação; casamentos “mistos” (i.e., em que apenas um dos cônjuges se convertera ao cristianismo) não oferecem motivo para o crente buscar o divórcio; a insistência do cônjuge descrente liberta o cônjuge crente de viver com ele(a), mas não para recasar (interpretando de maneira mais aberta o termo chorizestai, e de maneira mais fechada o termo dedoulotai, em 1Co 7.15).
  • O celibato traz certas vantagens (vv. 26-40). Uma vez mais, esta parte do capítulo parece sugerir que as preocupações dos coríntios estavam relacionadas ao ministério. Nesse contexto, o celibato oferece as seguintes vantagens sobre o casamento: (a) maior entrega ao serviço; (b) menos pressões em dificuldades; e (c) melhor proveito do pouco tempo.
O texto de 1Coríntios 11 é também bastante controvertido. É preciso reconhecer que Paulo invoca a tradição apostólica, uma esfera de atuação que não se limita ao transitório, acessório e cultural, mas ao permanente, essencial e teológico (cf. o uso do substantivo paradosis e do verbo paradidomi em 1Co 11.23, quanto à Ceia, em 1Co 15.3, com referência ao evangelho, e 2Ts 2.15, sobre a segunda vinda). Se não nos ativermos a esse fato, ficaremos à mercê das opiniões individuais quanto ao que Paulo apresenta nesta passagem. Em linhas gerais, podemos observar que:
  • O caráter excepcional da passagem exige uma comparação honesta com 1Coríntios 14 e 1Timóteo 2, sem rebaixar qualquer delas ao nível de sub-inspiração e sem recorrer a definições seletivas de termos.
  • O fato de Paulo ocasionalmente se valer de uma pedagogia que aceita por algum tempo posições erradas para futura correção não é cabível no caso de 1Coríntios 11 e 14, devido à grande distância entre os dois contextos.
  • O que a passagem considera não é o valor relativo do homem e da mulher, mas a hierarquia funcional estabelecida na Criação, confirmada na missão messiânica de Jesus (v. 3), e que deve ser continuada na assembléia cristã. Os argumentos de Paulo para o uso do véu não são culturais, mas são argumentos teológicos que procedem da revelação especial (aqui o relato da criação em Gênesis 1) e da revelação geral (o que Paulo diz ser percebido na própria natureza, v. 14). Assim, creio que o ônus de prova recai sobre quem tenta justificar a ausência do véu em nossos dias em termos meramente culturais.
  • A questão por trás dos argumentos era a postura arrogante, independente e insubmissa de algumas mulheres no culto público. Paulo permite o uso do dom mediante o uso do véu, símbolo que expressa submissão interior à corrente de comando estabelecida por Deus.[26]
No texto de 1Coríntios 14.33, 34, a ênfase recai sobre costumes estabelecidos em todas as igrejas dos santos, certamente determinados por seus fundadores apostólicos. Se o padrão refletia o da sinagoga, isto não é demérito da Igreja, e sim mérito para a sinagoga.
  • A exigência para que as mulheres fiquem em silêncio (oigao). Tendo em vista a permissão do capítulo 11, o verbo lalein deve significar algo mais que, ou diferente de, orar ou profetizar. Parece-me que tanto o modelo de pregação adotado por Paulo, descrito pelo verbo dialegomai (cf. At 20.7), quanto a sugestão de que os profetas fossem avaliados pelos irmãos estavam sendo mal usados em Corinto. Lá, durante o culto, as mulheres argüiam indiscriminada e ostensivamente os profetas (cf. v. 35 e 1Tm 2.11,12). Segundo Paulo, ao exibir sua “independência”, a mulher cometia ato vergonhoso (aischron), depreciando o valor intrínseco de sua feminilidade. Elas próprias acabavam por diminuir seu valor extrínseco.
Como interpretar o texto de 1Timóteo 2.9-15
  • O recato no vestir é condição sine qua non para o ministério da mulher crente (cf. o uso do advérbio osautos, que aponta para uma identidade de conceitos entre este parágrafo e o anterior). O verdadeiro adorno de uma mulher ou jovem solteira é sua atitude de serviço e obediência.
  • O uso da palavra katastole sugere que algumas mulheres em Éfeso adotavam padrões comuns às mulheres romanas, mais “liberadas”. Talvez até se tratasse de padrões adotados pelas famosas hetairai, os quais estavam sendo introduzidos na igreja por meio da sensualidade e da independência acintosa daquelas mulheres. A ênfase da passagem está no bom gosto e no bom senso (kosmos).
  • O que Paulo exige das mulheres neste texto difere do apresentado em 1Coríntios 14. Aqui ele não exige silêncio, mas tranquilidade, mansidão ou quietude (hesuchia, v. 11). O discutido verbo authentein não pode ser usado como justificativa para afirmar que o que Paulo proíbe é apenas o ensino autoritário, dominador das mulheres. A idéia real do verbo é exercer autoridade de qualquer tipo.[27]
  • Nos versículos 13 e 14, o silêncio pedagógico imposto à mulher se deve à prioridade na criação e à falta de fidedignidade histórica da mulher como guia espiritual. À luz dessas considerações, o versículo 15 não se refere à salvação no sentido soteriológico eterno. A mulher será libertada desse incômodo status causado pela ação de Eva no Éden ao demonstrar ser um guia espiritual digno de confiança dentro dos limites prioritariamente domésticos que lhe foram estabelecidos por Deus. Gerar filhos e educá-los de modo que eles permaneçam no caminho do Senhor qualificaria publicamente uma mulher como “mestra do bem” (cf. Tt 2.3).[28]
Há três interpretações possíveis para o termo grego gunaikas em 1Timóteo 3.11:
1- Alguns afirmam que o termo se refere a esposas de diáconos sob as seguintes alegações:
  • gune é o termo normal para “esposa” no Novo Testamento;
  • as mulheres de que fala a passagem estão diretamente relacionadas aos diáconos;
  • o tipo de ministério diaconal permite sua menção, em contraste com os presbíteros, cujas esposas não poderiam partilhar seu ministério.
2- Outros preferem ver aqui uma referência às diaconisas, sob as seguintes alegações:
  • a conjunção wJsauvtw~ indica uma terceira classe de obreiros;
  • Febe foi chamada de “diaconisa” em Romanos 16.1;
  • a palavra gunhv é um termo geral para “mulher”; não se limitava a esposas;
  • documentos do século iii indicam que a função de diaconisa foi instituída, eventualmente, pelas igrejas cristãs, talvez por volta do século ii.[29]
3- Uma terceira opinião é que o texto se refere a assistentes não-casadas (viúvas ou virgens) dos diáconos. Vejamos as argumentações:
  • a relação descrita é de trabalho, não de casamento, pois logo depois é mencionado o status conjugal exigido dos diáconos;
  • a ausência de pronomes possessivos sugere que as “mulheres” não estavam relacionadas aos diáconos;
  • não há qualificações familiares, supostamente necessárias para o caso de Paulo introduzir um terceiro nível de ministério;
  • o mais lógico, no caso de Paulo especificar outro nível de ministério, seria antes finalizar os requisitos para o diaconato masculino;
  • historiadores sugerem que apenas solteiras e viúvas eram “diaconisas”.
A meu ver, o que começou como um ministério destinado a viúvas foi depois estendido às virgens, e em tempos modernos englobou mulheres casadas. Historicamente essas “mulheres” serviam aos desvalidos pela sorte, aos enfermos, ajudavam na preparação das mulheres para o batismo cristão e no discipulado de mulheres em famílias pagãs, onde a presença de homens seria vista com grande suspeita.[30] Pessoalmente, não vejo problema no uso do termo diaconisa, mas prefiro a terceira alternativa.
O texto de Gálatas 3.28 é fundamental para o movimento feminista “evangélico”, para os que defendem um ponto de vista igualitário no ministério. O argumento é que a redenção em Cristo aboliu todas as barreiras e distinções causadas pela Queda. Infelizmente, complementaristas desavisados têm respondido a esse argumento de maneira às vezes agressiva e às vezes simplista. O que os complementaristas precisam fazer para responder adequadamente a tais propostas teológico-sociológicas?
Indicar os problemas da abordagem feminista:
  • em primeiro lugar, é preciso levar em igual conta as passagens que ensinam alguma medida de subordinação. Infelizmente, as “feministas”, como Mickelsen, Scanzoni, Schroeder entre outras, sugerem que Paulo se contradiz ou que as passagens subordinacionistas não são de Paulo, o que revela o problema teológico de uma sub-inspiração para partes do cânon;
  • em segundo lugar, é preciso entender que o verbo usado por Paulo quando se refere a mulheres e maridos (hupotasso) indica realmente subordinação, e não simples “ordem”, como exige o feminismo, o que revela um problema de exegese tendenciosa, ou eisegese;
  • em terceiro lugar, é preciso destacar que em nenhuma das passagens relacionadas à subordinação Paulo usa argumentos de natureza cultural. Todos são teológicos e todos se baseiam na ordem e hierarquia da Criação, não da Queda.
Indicar os conflitos sociais que tal abordagem traria: exigência de extinguir níveis sociais e de instaurar a anarquia civil.
Indicar uma alternativa bíblica:
  • a igualdade ontológica (expressa nos termos usados, “macho” e “fêmea”, e não “homem” e “mulher”) não elimina a hierarquia social-funcional (para a qual há um paralelo na própria doutrina da Trindade);
  • o que a Queda nos tirou não foi a igualdade absoluta entre homem e mulher, mas a harmonia na hierarquia que Deus instituíra na criação. As palavras de Deus a Eva em Gênesis 3.16 sugerem que o desejo da mulher seria “contra” o marido, e não “para” (cf. Gn 4.7; verificar a tradução da nvi e a nota de rodapé para esta passagem). O que Cristo restaurou foi a ausência de competição no relacionamento, quer em termos de casal, quer em termos de comunidade.
Vejamos, ainda, a título de conclusão algumas passagens ocasionais. Em Romanos 16 e em Filipenses 4, Paulo menciona mulheres que trabalharam a seu lado em prol da causa cristã. Febe é o ícone especial das feministas, por ser supostamente chamada de “diaconisa”. No entanto, o texto de Romanos 16.1 diz apenas que ela uma serva na igreja em Cencréia. [31]
Júnias, que é chamada de notável entre os apóstolos (Rm 16.7), poderia na verdade ser o Junias, dada a natureza ambígua dos nomes latinos terminados em    -as. Mesmo que se trate de mulher, a expressão não descreve necessariamente um membro da companhia apostólica, mas apenas pessoas importantes aos olhos dos apóstolos.[32]
As demais mulheres claramente ocupam lugar de destaque, mas não recebem nenhuma indicação de posição pastoral ou presbiteral. Somente as lentes exegéticas das feministas determinam o que elas encontram em tais passagens.
Em Filipenses 4, Evódia e Síntique trabalharam com Paulo e são, por isso, dignas de atenção e deferência não só por parte do apóstolo, mas de seu “companheiro de jugo”. Este provavelmente ministrava em Filipos numa posição em que poderia, ao mesmo tempo, corrigir e encorajar as duas irmãs.

Conclusão

O Novo Testamento indica que a mulher desfruta dos mesmos privilégios espirituais que o homem, mas com responsabilidades diferentes. A mulher deve submissão ao homem em duas esferas específicas: paternal e matrimonial. Essa submissão deve refletir-se em sua principal esfera de atividade: o lar, onde ela pode e deve buscar sua maior realização.
A solteira desfruta de maior liberdade, mas é igualmente responsável por demonstrar uma atitude de submissão. O texto de 1Timóteo 2.10 exorta as solteiras a se dedicarem ao ministério assistencial.
O ministério da mulher como mestra na igreja é extremamente importante. Gerações de crentes têm desperdiçado seu potencial de discipulado e preparação de novas mestras do bem. Nossas igrejas locais têm sido prejudicadas por tal negligência, que considera inferior a quem Deus concede honra.
Seminários muitas vezes têm contribuído para acentuar essa negligência, priorizando o acadêmico em detrimento do pessoal, do cultivo de um espírito manso e tranqüilo (por favor, não releiam Pedro para entender “vaquinhas de presépio”), e de um anseio por valorizar o discipulado e o aprendizado, a mentoria de outras mulheres mais jovens.
Maridos crentes têm incentivado essa revolta latente contra os princípios bíblicos por fugirem de assumir sua responsabilidade de liderança da igreja local, lançando-a sobre os ombros de suas esposas e de mulheres solteiras. Quão melhor fazer da parceria marido-esposa, noivo-noiva, namorado-namorada o modelo para a educação cristã em nossas igrejas.
O verdadeiro complementarismo, embasado numa teologia bíblica da mulher, oferece à igreja do século xxi um desafio que, se aceito em fé esclarecida pela exegese (não pela cultura), dinamizará relacionamentos e mudará a face de nossas comunidades.